quarta-feira, 7 de abril de 2010

Mário Barbosa compra Kit Car a pensar nos ralis


A menos de 10 dias da Pista da Costilha receber a abertura do Campeonato de Portugal de Ralicrosse, fomos conhecer os projectos futuros de Mário Barbosa, 32 anos, piloto de Paredes que se tem evidenciado nas últimas temporadas. Depois de dois vice-campeonatos e três títulos consecutivos na competitiva Divisão 3, Mário Barbosa elevou a fasquia transferindo-se para a Divisão 2, aos comandos de um potente Citröen Saxo Kit Car.
É também a idealizar uma passagem para os ralis que Mário Barbosa adquiriu a nova máquina, um carro preparado e com garantias dadas nesta vertente do desporto automóvel. Na base desta hipótese está o caótico panorama que a modalidade atravessa, tendo, nos últimos anos, vindo a perder notoriedade face ao desinteresse dos pilotos, que não conseguem suportar os encargos financeiros exigidos. O dedo, o piloto aponta-o à FPAK, que no seu entender não soube acompanhar a crise. Refira-se que até ao momento a lista de pilotos inscritos para o campeonato de 2010, em pouco ultrapassa a dezena de pilotos, em todas as divisões.




TVS: O que te fez mudar para a Divisão 2?
MÁRIO BARBOSA: Foram muitos factores. Mas, principalmente, foi o facto de termos sido três vezes campeões na Divisão 3 e da saturação inerente face aos objectivos serem sempre conseguidos. Assim optamos por passar para a Divisão 2 com um carro muito mais competitivo.

TVS: Mas isso poderá ser um contra-senso. A divisão 2 pode ter carros mais potentes, mas a 3 tem sido a mais participada e onde a disputa é mais aguerrida?
MB: Sim, é verdade que nos últimos anos assistimos sempre a lutas interessantes entre mim e o Sousa e depois com o Rui. Mas, aproveito para desmistificar uma ideia que os adeptos têm: os carros da Divisão 3 são mais rápidos e competitivos que os da Divisão 1. Com chuva ganhei-lhes uma manga em Montalegre.

TVS: Como é pilotar o novo carro?
MB: Não tem nada a ver com os que conduzi até agora. É uma diferença abismal que se sente a curvar e nas travagens. Eu já tinha uma boa caixa de velocidades no Saxo Cup, mas a deste é absolutamente inacreditável.

TVS: As poucas horas ao volante já deram para notar essas diferenças?
MB: Estou muito satisfeito. Só para ter uma ideia, fomos a Sever do Vouga e em ritmo de treino, com o piso bastante degradado e a rodar nas calmas, fizemos menos 1 segundo. Penso que a andar bem este carro faz menos 3 segundos que o anterior. Isto é muito tempo, pois estamos a falar de mais de metade da recta da meta de avanço, por volta.

TVS: E, quais são as metas colocadas para esta nova etapa?
MB: Os objectivos são claros e passam por ganhar, obviamente. Quem entrar nesta competição e afirmar o contrário, eu digo que está a mentir. No entanto vamos partir com outro propósito que passa por ganhar experiência e adaptação ao carro e talvez apostar nos ralis, no próximo ano.

TVS: Estás a falar da passagem dos traçados fechados para os troços cronometrados?
MB: A nossa grande paixão (da equipa) são os carros e fizemos essa adaptação ao ralicrosse, que a nível de disponibilidade exige muitos menos, e isso é algo que não temos. Todos adoramos aquilo que fazemos, mas se não tivermos concorrentes, nem o piloto consegue tirar prazer. Raramente treino com os carros, é chegar ao dia da prova e correr. Aí tenho de dar os parabéns ao Paulo (mecânico) que tem feito um trabalho magnífico. Ele também diz que é fácil trabalhar comigo porque transmito-lhe na perfeição a performance do carro e o que quero dele.
Respondendo à pergunta, apenas posso dizer que este carro não dá para mais nada, a não ser para competir e se não houver competição, temos de arranjar outra solução.

TVS: Depreendo pelas tuas palavras que não estejas satisfeito com o cenário actual da modalidade?
MB: Não estou sequer a ver futuro para o ralicrosse em Portugal. Parece-me que nem pilotos vamos ter para competir. Estamos prestes a começar o campeonato e ainda não sei se vou ter muitos rivais. Já o ano passado prevíamos um futuro negro e perante esse receio nem evoluímos o carro nas primeiras provas. Esta temporada a dúvida é ainda maior, pois com só 10 estão inscritos no total, nesta altura…

TVS: Mas, os ralis compreendem outras exigências financeiras, para além de uma maior disponibilidade…
MB: Por aquilo que nos dizem é mais dispendioso. Mas, a nível de mecânica é menos agressiva para o carro. Contudo, é também mais fácil cometer um erro e destruirmos um carro. Nas pistas sabemos os limites, enquanto nos ralis dependemos muito do navegador e da nossa confiança nele.

TVS: Na tua opinião, quem é o principal responsável pela actual situação no ralicrosse?
MB: É, sobretudo, a crise, mas também a federação porque não a soube acompanhar. Se assim fosse não fazia tantas exigências, como o pagamento da inscrição no campeonato (só agora é preciso) e depois a inscrição por prova. São demasiadas exigências técnicas e mesmo a nível de segurança, que nunca deve ser descurada, existem algumas que são um exagero. Estamos a falar de um desporto pobre e todos sabemos que não é tão fácil arranjar patrocínios como há uns anos atrás. Há por aí muitos bons carros encostados e a competir nas provas piratas e penso que se a FPAK fosse mais compreensiva eles regressavam.

TVS: Qual seria então a solução?
MB: Baixar o preço das inscrições na prova e acabar com a cobrança do registo para o campeonato. Sinto que se estão a aproveitar dos pilotos e estou indignado mesmo, pelo facto de equipas e pilotos terem de pagar para dar espectáculo. Os jogadores de futebol, por exemplo, não têm de o fazer. A comunicação social, essencialmente as televisões, também têm a sua culpa. Dão tanto destaque a outras modalidades e à nossa, que é provavelmente a que mais adrenalina transmite, raramente ocupa as notícias dos audiovisuais. À excepção de alguma imprensa local e do Jornal Motor, mais ninguém acompanha o ralicrosse e o autocrosse. Obviamente que isso reflecte-se depois na falta de patrocínios.

TVS: Sentes-te discriminado em relação às outras modalidades?
MB: Claramente. E, não é só em relação a outros desportos, mesmo dentro dos motorizados somos discriminados. Basta ver as horas de transmissões televisivas que o Todo-o-Terreno tem tido. Isto para não falar de outro tipo de desportos que em Portugal tem meia dúzia de seguidores, mas que face a interesses que desconheço continuam a ser alvo de enfadonhas e intermináveis horas de transmissões.


Currículo Desportivo
A entrada de Mário Barbosa no desporto motorizado, especificamente nas corridas de Ralicrosse, deu-se quando ainda não tinha sequer atingido a idade legal para se habilitar a adquirir a carta de condução. Aos 16 anos foi com o pai assistir a uma prova pirata e logo aí o "bichinho" despertou para o que mais tarde viria a resultar na conquista de quatro títulos nacionais. O tio "Adão da Gatel" ofereceu-lhe um carro e o pai concedeu-lhe a permissão para competir. A estreia ocorreu numa prova pirata que teve lugar na Seroa (Paços de Ferreira) e no meio de vários pilotos experientes, os organizadores aconselharam-no a arrancar mais tarde. Tal veio a acontecer, mas volta a volta, o jovem foi conquistando posições e cortou a linha de meta na frente. "Tudo começou aí", recordou Mário Barbosa.
Nos seis anos que se seguem participa nas provas piratas, passando depois para o Nacional de Ralicrosse. Compra um Peugeot 205 Mi16 e integra a Taça de Ralicrosse, tendo exercido um domínio absoluto. Vence quase todas as provas e sagra-se campeão no ano de estreia. Na segunda temporada não foi tão feliz. O carro deu evidentes sinais de "fadiga" e perante a impossibilidade de substituir a máquina, desiste do campeonato a meio da época, ao qual se segue um ano de inactividade. Mas, foi no final desse ano sabático que o primo, Hugo Barbosa, o convidou a integrar a sua equipa para as "6 Horas de Ralicrosse" ao volante de um Peugeot 205 Rallye. Esta participação voltou a despertar o "monstro adormecido". Comprou o carro ao primo, que entretanto adquiriu um Citröen Saxo Cup, e regressou ao Nacional, mas desta vez para competir no Campeonato (Divisão 3).
Esta é a altura em que os Saxo Cup surgem no panorama do ralicrosse e estas máquinas não dão hipóteses à concorrência, pelo que o regresso não foi tão auspicioso como a estreia absoluta. Os dois anos seguintes ficou-se pelo meio da tabela, mas no último ano com o 205 Rallye, voltou a ficar com o carro do primo, isto quando faltavam disputar três provas para o final do campeonato. A primeira prova aos comandos do carro que lhe viria a dar três títulos na Divisão 3, aconteceu em Sever do Vouga e desde logo os resultados foram prometedores. Nessa corrida não pôde participar nos treinos, mas mesmo largando do último lugar numa das mangas de classificação, conseguiu o melhor tempo. Nas derradeiras três corridas anulou um atraso significativo para a liderança e perdeu o campeonato para o lousadense, José Artur Teixeira, a quem bastava alinhar para a final, na última prova da época, realizada em Lousada.
No primeiro ano a tempo inteiro ao volante do Saxo Cup, perdeu o campeonato, na secretaria, para outro lousadense, António Sousa, após uma controversa final na penúltima prova, em Montalegre. Recorde-se que nessa corrida a polémica instalou-se após um toque de António Sousa na traseira do carro de Mário Barbosa que o atirou para fora da pista e este é um episódio que o paredense revive com amargura: "Ainda é hoje o dia que não sei como é que ele ganhou".
Contudo, no ano seguinte o duelo entre os dois manteve-se aceso durante toda a temporada, mas no final a balança pendeu para o lado de Mário Barbosa, que satisfez assim o desejo da desforra.
Foi o primeiro de mais dois títulos que se seguiram, agora com o jovem Rui Sirgado a ser o principal e único rival do tri-campeão nacional.
A NOVA MÁQUINA
O Citröen Saxo kit Car é um carro que por si só impõe respeito, face ao palmarés conseguido pelos pilotos que o tripularam. O mais recente foi Octávio Nogueira, que se sagrou campeão nacional de ralicrosse na Divisão 2, antes de iniciar um périplo pelos ralis. Mas, foi fora dos traçados fechados que o pequeno Kit Car alcançou resultados impressionantes. Os dois primeiros títulos de Campeão Nacional de Ralis, Armindo Araújo, foram aos comandos deste bólide que alguns referem ter sido o mesmo que levou Sebastien Loeb à conquista do campeonato francês. Este é um dado que não conseguimos comprovar, mas é certo que este foi um dos carros da equipa oficial francesa e as datas (Armindo pilotou-o de 2002 a 2004 e antes já tinha pertencido a Vítor Lopes) apontam para a veracidade desta suposição.
- Fabricante - Citroen Sport
- Tracção dianteira
- Potência - 224 cv
- Jantes de 17"

Patrocinadores
Compincar - Wurth - Jopaulo - A2 Publicidade
Serração Dias Ferreira & Silva
Serração José Dias, Ld.ª
Marfidente - Mourizcampo
Ventilações Moura - ElectroBarbosa

CURIOSIDADE
Para os aficionados da modalidade é quase um dado adquirido que os potentes carros da Divisão 1 são os mais rápidos em pista. Contudo, este é um erro comum e nem sempre é verdade. O recorde da pista de Montalegre pertence a um Citröen Saxo Cup e foi alcançado precisamente por Mário Barbosa, numa prova em que ambas as divisões competiram juntas e surpreendentemente, o pequeno carro da "double chevron", com o piso molhado, venceu numa das mangas, as máquinas melhor equipadas, em termos de potência. Os resultados só não são mais espantosos, porque com o piso seco, os Ford Focus, os Mitsubishi Evolution & C.ª de tracção total ganham logo no arranque uma distância significativa.

Publicada "in TVS", por Carlos Mota

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